Volta às aulas em formato presencial para as turmas de ensino médio no Ceará continua sendo tema de impasse. Os danos causados pelo ensino remoto relatados por alunos e o risco de contaminação diante da pandemia do coronavírus são colocados na balança diariamente. A vice-presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Ceará (Sinepe-CE), Andréa Nogueira, avalia a retomada gradativa. “Os protocolos implementados pelas instituições de ensino, que seguem rigorosamente as normas estabelecidas pelas autoridades e órgãos sanitários, já mostraram que são suficientes para trazer segurança aos alunos e professores. Esse rigor e seriedade com os quais tratamos a questão fazem das escolas um dos ambientes mais seguros de todos”, diz.
O sindicato das escolas particulares defende que as turmas de ensino médio possam voltar ao modelo presencial porque outras séries foram contempladas com esse tipo de medida. “Quanto à retomada das aulas, continuamos defendendo a volta das atividades do ensino médio, que até agora estão fora dessa retomada, sem justificativa científica. Como consequência, os alunos estão há mais de 400 dias fora da escola”, explica Andréa.
No último dia 6 de maio, em entrevista à Rádio O POVO/CBN, o governador Camilo Santana (PT) demonstrou estar ciente da causa e prometeu discutir o assunto ainda naquela semana, entretanto, nenhuma mudança foi feita até então. “Sei que há esse apelo por parte dos pais e alguns professores. Retomaremos essa discussão na reunião do Comitê amanhã (7 de maio). Se tem uma coisa que prezamos muito é pela educação. Há uma luta inclusive pela vacinação dos professores no Ceará”, explicou o governador.
Rotina desgastante
Camilla Graça, 15, aluna do segundo ano do ensino médio, é uma das estudantes que se sentem prejudicadas com as aulas remotas. Além de sentir falta dos amigos, dos professores e do próprio ambiente escolar, a jovem explica que o modelo virtual impacta o aprendizado dela. “Não conseguimos prestar tanta atenção nas aulas online, possuímos diversas distrações no nosso dia a dia. Este período está sendo muito difícil pra mim e para os meus colegas no sentido emocional também. O pessoal do segundo ano já está há um ano e dois meses sem as aulas presenciais, e é muito difícil, estamos exaustos. Realmente, é muito cansativo passar mais de cinco horas olhando para o celular ou para a tela do computador, queremos a volta às aulas presenciais”, pede.
João Vitor, 15, aluno do primeiro ano do ensino médio, é outro estudante favorável ao retorno das aulas presenciais. “Está sendo bem difícil pra gente, porque não temos a mesma interação de uma aula presencial com colegas e professores, não vejo a mesma qualidade no ensino. De acordo com pesquisas, vi que escolas que adotam medidas de segurança são ambientes seguros. São mais de 400 dias sem aulas, já passou do limite, um recorde mundial, né? Sem estudar, nós ficamos para trás, não é isso que queremos”, desabafa.
O jovem acredita que os estudantes também estão preparados para a retomada seguindo todos os protocolos. “As escolas estão oferecendo, cabe a cada um respeitar. Da minha parte, eu vou respeitar. Sei que muitos alunos também vão. A questão de utilizar a máscara e trazer o próprio lanche de casa, evitar contatos físicos e manter o distanciamento social. Estou muito esperançoso, vai dar certo, a galera vai respeitar.”
Preocupações com a retomada
Apesar do apoio de boa parte dos alunos e pais, o retorno às aulas é questionado por alguns professores. “Enquanto os professores não forem imunizados, eu não sou favorável ao retorno presencial. Vejo um risco grande, porque os adolescentes não vão obedecer à risca as medidas. É difícil manter esse isolamento e essa responsabilidade do uso de máscara, do distanciamento social. É complicado para o professor. Eu tive a experiência da aula presencial às vésperas do Enem, foi muito difícil, porque eles faziam coisas que não deveriam fazer”, comenta Vera Duarte, 68, que lecionou durante 45 anos, mas foi desligada das atividades antes do início do ano letivo de 2021 devido aos riscos da pandemia.
A professora também conta que muitos educadores se submetem aos riscos por medo. “Em um grupo que tenho com amigos professores, todos são contra o retorno das aulas presenciais. Um dos meus colegas lamentou o fato de não poder fugir da necessidade de dar aulas, mesmo percebendo os alunos desobedecerem as medidas nas vésperas do último Enem. Além do medo, ficou muito revoltado por não poder fazer nada”, diz ela.
Vacinação
De acordo com a vice-presidente do Sinepe-CE, Andréa Nogueira, o sindicato preza pela vida dos profissionais de educação. Ela afirma que, desde abril, o Sinepe realizou requerimento, junto à secretaria de saúde do município, para que professores e profissionais da educação entrem no grupo prioritário de vacinação. “Valorizamos muito os profissionais da educação e, assim como acontece em relação a nossos alunos, prezamos pelo atendimento de todos os protocolos visando à garantia da saúde deles. Os profissionais da educação não trabalham em um ambiente inerentemente menos seguro do que os demais profissionais de outros setores”, relata Andréa.
Segundo a representante do Sinepe-CE, o sindicato trabalha com pesquisas que indicam que o retorno às aulas presenciais não oferece grande risco. “A pesquisa mais recente, realizada na Escócia, mostra que o risco de hospitalização entre professores é 3% menor do que nas demais profissões – com exceção dos profissionais de saúde, que têm um risco 82% maior. E vale destacar que os protocolos utilizados no Ceará são mais exigentes do que os utilizados na Escócia”.
Riscos da retomada
Uma das preocupações do Governo do Estado quanto à retomada das aulas presenciais é a eventual necessidade de voltar atrás no processo de retomada. “O pior dos mundos é a gente avançar na abertura e depois ter que fechar de novo”, afirmou Camilo Santana, em entrevista concedida no último dia 6. O governador destacou que as decisões são tomadas com base na avaliação dos indicadores epidemiológicos.
Para o professor Anizio Melo, presidente do Sindicato dos Professores e Servidores da Educação do Ceará (Apeoc), as escolas devem buscar garantir boas condições para que alunos e professores desfrutem ao máximo do ambiente virtual. Anizio acredita que a expansão do modelo presencial só deve ser tratado diante de uma vacinação em massa da população. “Há uma completa irresponsabilidade na gestão dos entes federados, que não conseguem garantir vacinas ou manter relações para garantir insumos. Isso provoca uma instabilidade geral na sociedade. Entendemos que, com essa conjuntura, com essa realidade, o retorno às aulas só pode ser pensado a partir do momento que se garanta segurança sanitária. Isso passa por acelerar a vacinação dos profissionais de educação”, destaca.