Por trás da morte do advogado Francisco Di Angellis Duarte de Morais, de 41 anos, há uma sequência de ameaças e exigência de pagamento de valor milionário em troca de retirar notícias de um site que falavam da ascensão econômica de um empresário dos ramos de cooperativa de saúde e postos de combustíveis.
Conforme a denúncia do Ministério Público do Ceará (MPCE), o empresário Ernesto Wladimir de Oliveira Barroso disse à Polícia Civil do Ceará (PC-CE) que teria se desentendido com o advogado devido a “matérias jornalísticas e postagens em grupos de Whatsapp” que falaram da sua ascensão financeira. Tudo começou, segundo Ernesto, quando ele negou ao deputado federal pelo Ceará Júnior Mano (PL) parte do dinheiro das emendas federais que o parlamentar direcionou para a área da saúde.
Dias depois, teriam começado a circular no Don7 Media Group, do jornalista Donizete Arruda, notícias que Ernesto tinha cavalos de valores milionários e matérias jornalísticas de denúncias contra a cooperativa de saúde a qual Ernesto era diretor. “Tais postagens foram encaradas pelo denunciado Ernesto como ataques à sua pessoa e que suscitavam dúvidas quanto a lisura de seu patrimônio”, conforme trecho da denúncia.
NOVAS INVESTIGAÇÕES NA POLÍCIA CIVIL
A denúncia do Ministério Público do Ceará sobre o homicídio não encerra as investigações ligadas ao crime. A Polícia Civil apura pelo menos dois crimes ligados à morte do advogado Francisco Di Angelis Duarte de Morais.
O DHPP remeteu os autos do inquérito do homicídio para as delegacias de Roubos e Furtos (DRF) e de Combate à Corrupção (Decor), para investigar novos crimes.
reportagem apurou que a DRF já instaurou um novo inquérito para apurar a denúncia de extorsão, que o acusado de homicídio, o empresário Ernesto Wladimir de Oliveira Barroso, teria sofrido. Já o objetivo da Decor é apurar um suposto desvio de verbas públicas.
O Diário do Nordeste solicitou à Polícia Civil do Ceará uma entrevista sobre as novas investigações, mas a Instituição respondeu que “não vai comentar sobre investigação em andamento”.
Nessa segunda-feira (28), a Justiça decidiu receber a denúncia “em todos os seus termos” e determinou que os três acusados, agora réus, sejam intimados a apresentarem defesa, no prazo de 10 dias.
O deputado federal Júnior Mano e o jornalista Donizete Arruda – que foram arrolados como testemunhas na denúncia do MPCE – foram procurados pela reportagem, mas não responderam até a publicação dessa matéria.
[ATUALIZAÇÃO – 14h30]
O deputado federal Júnior Mano disse que a versão do acusado do homicídio do advogado de que sofreu extorsão cometida por ele é inverídica. “A referência ao nome do Dep. não encontra nenhum respaldo no contexto probatório, tratando-se de uma versão isolada e inverídica apresentada apenas pelo acusado com objetivos políticos e de ofuscar o grave crime pelo qual está preso e respondendo perante a Justiça Criminal”.
Ele afirmou ter compromisso com “a transparência, a ética e a veracidade dos fatos, e confiamos nos órgãos responsáveis pela persecução penal, dos quais estamos inteiramente à disposição”.
A defesa do empresário Ernesto Barroso disse que “se manifestará nos autos do processo”. Já Alexandrina França, advogada dos ex-PMs disse ser “prematuro fazer algum pronunciamento, em razão da ação penal acabar de ter sido instaurada e tratar-se de um processo que conta com uma investigação policial extremamente extensa e complexo”.
NOTÍCIAS DESABONADORAS
“Segundo a versão do acusado Ernesto, é de conhecimento público a relação entre o deputado federal e o jornalista responsável pela divulgação das notícias desabonadoras. Isso ficou evidenciado, quando o acusado teria entrado em contato com o deputado federal, reclamando das notícias veiculadas pelo Don7 Media Group. Em resposta, o deputado federal teria usado de ironia, afirmando ao acusado Ernesto que iria corrigir o jornalista, pois ele (o jornalista) teria errado o nome do acusado, escrevendo o nome “Ernane”, ocasião que se confirmou que as matérias então publicadas também interessavam ao deputado federal”. Ministério Público do Ceará – Na denúncia
Para que as matérias saíssem do site, ainda no mês de março deste ano, começaram as negociações entre Di Angellis (responsável jurídico pelo grupo de comunicação) junto ao empresário.
Primeiro, segundo Ernesto, foi exigido o valor de R$ 1,5 milhão, tendo ele ficado inconformado com a elevada quantia proposta. “Inicialmente, o acusado não se comprometeu a pagar a quantia. Contudo, aconselhado por amigos, buscou renegociar o valor da extorsão”.
Outro empresário do ramo de cooperativa de saúde – além de ser proprietário de lojas de veículos – procurou, então, Ernesto, “para resolver as matérias publicadas por Donizete contra a sua pessoa”. Um encontro foi marcado, em uma cafeteria, no bairro Dionísio Torres, com a presença de Lúcio, do advogado Francisco Di Angelis e de outro empresário do ramo de cooperativas de saúde.
Que Moraes (o advogado) foi claro que o interrogando teria que pagar uma quantia em dinheiro para que Donizete retirasse as matérias que o atacassem dos seus veículos de comunicação. Que Moraes se dirigia apenas para o interrogando. Que Moraes teria proferido diversas vezes que ‘Doni’ (Donizete) só iria retirar as matérias quando interrogando pedisse desculpas a Júnior Mano.”
ERNESTO WLADIMIR OLIVEIRA BARROSOEm depoimento à Polícia Civil
Com a intervenção do empresário do ramo de veículos, o valor baixou para R$ 800 mil, que foi levantado por ele próprio, para ajudar o amigo. Ernesto recebeu o dinheiro e levantou um empréstimo bancário nesse valor, para pagar o colega.
R$ 800 MILforam entregues por Ernesto Wladimir para o advogado Francisco Di Angelis, em uma padaria, no Eusébio, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), na manhã de 28 de abril deste ano, segundo o suspeito preso.
Após o pagamento, Ernesto afirmou que “foram apagadas as matérias veiculadas por Donizete contra a sua pessoa. Que após esse fato, não teve mais contato com a vítima. Que soube por meios jornalísticos depois que ela teria sido assassinada”.
ADVOGADO FOI MONITORADO POR ACUSADOS
Enquanto tentava reduzir os valores, Ernesto teria começado a arquitetar uma emboscada para se vingar da extorsão. O acusado teria obtido dados cadastrais do automóvel do advogado junto a um policial militar da ativa (que não foi acusado pelo crime) e contratado dois ex-policiais militares, Glauco Sérgio Soares Bonfim e José Luciano Souza de Queiroz, para cometer o crime.
“De posse destas informações, o réu Ernesto providenciou que os réus José Luciano e Glauco submetessem a vítima à vigilância com a finalidade de preparar uma futura emboscada e, em consequência, o assassinato da vítima”
MPCE
O advogado Francisco Di Angelis Duarte de Morais teria sido monitorado pelos criminosos – inclusive com o uso de um rastreador no veículo da vítima – dias antes do crime. Policiais civis da 6ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) descobriram que dois homens estiveram, em um carro, no local de trabalho de Francisco Di Angelis, uma torre empresarial no bairro Edson Queiroz, em busca de saber qual era o veículo do advogado, na manhã de 24 de abril deste ano.
Os dois homens informaram a funcionários do empreendimento que tinham interesse em comprar o carro. Um deles foi reconhecido por testemunhas como o ex-policial militar José Luciano Souza de Queiroz – que está preso preventivamente e foi indiciado pelo homicídio ocorrido no dia 6 de maio último.
Ao descobrir que dois homens procuraram pelo seu veículo, Di Angelis conversou com funcionários da torre empresarial e negou que estivesse vendendo o seu automóvel. O advogado ficou preocupado e perguntou sobre as imagens das câmeras de monitoramento do empreendimento.
Francisco Di Angelis acabou assassinado a tiros no bairro Parquelândia, em Fortaleza, no dia 6 de maio deste ano. Para o MPCE, “o crime tem como mandante o acusado Ernesto. Por sua vez, os réus José Luciano e Glauco agiram como executores materiais do delito”.
“O motivo do delito é de natureza torpe, eis que consistente em vingança devido à extorsão praticada pela vítima. A vítima teria exigido a quantia de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais), efetivamente pago pelo réu Ernesto, constituindo o homicídio o justiçamento pela extorsão e um recado de que jamais poderia ser incomodado, dessa forma, outra vez”, afirmou o Órgão Acusatório.
Nota deputado Júnior Mano na íntegra
Segue a nota:
“A referência ao nome do Dep. não encontra nenhum respaldo no contexto probatório, tratando-se de uma versão isolada e inverídica apresentada apenas pelo acusado com objetivos políticos e de ofuscar o grave crime pelo qual está preso e respondendo perante a Justiça Criminal.
Reiteramos nosso compromisso com a transparência, a ética e a veracidade dos fatos, e confiamos nos órgãos responsáveis pela persecução penal, dos quais estamos inteiramente à disposição.”.